05 mar, 2024 - 18:07 • Maria João Costa
É lançado a nível mundial, na quarta-feira, um romance inédito de Gabriel García Márquez (1927-2014). A obra “Vemo-nos em Agosto” (ed. D. Quixote) terá também edição em português, e é posta à venda dia 6 de março, com tradução de J. Teixeira de Aguilar. O livro foi apresentado esta terça-feira, a partir de Madrid, numa conferência no Instituto Cervantes, à qual assistiram mais de centena e meia de jornalistas de todo o mundo.
A diretora editorial da divisão literária do Grupo Penguin Random House, que lança o livro, explicou que García Márquez leu as primeiras páginas deste livro, a “18 março 1999, numa conferência, na Casa da América Latina, em Madrid, quando partilhava uma mesa com o recém-nomeado Prémio Nobel, José Saramago”. Aí leu o primeiro capítulo do romance que tinha o título que o livro veio a ter.
“Vemo-nos em Agosto” é um romance que conta a história de Ana Magdalena Bach, uma mulher casada, com dois filhos e uma vida estável, que todos os anos viaja em agosto para a ilha onde a mãe está sepultada, para visitar o seu túmulo. A cada viagem, e a cada ano, esta personagem arranja um novo amante. Segundo os filhos de García Márquez, que estiveram presentes na conferência, “a protagonista é uma mulher livre, com força e carácter”.
A obra, que terá uma tiragem de 250 mil exemplares na primeira edição, “enriquece a obra monumental” de Gabo, como era conhecido, referiu a editora Pilar Reyes. Dez anos depois da morte do Prémio Nobel da Literatura de 1982, o livro que agora é lançado inclui um prólogo que explica aos leitores as circunstâncias em que a obra surgiu, assinado pelos filhos Rodrigo e Gonzalo García Barcha.
Na conferência de imprensa desta terça-feira, Gonzalo explicou que “não se acrescentou nada" ao que o pai deixou. "Houve uma altura em que disseram que faltava um final, mas conversando com Gabo em vida, Cristóbal Pera perguntou-lhe, e ele disse: 'Não, o romance tem um final.'”
“Não se fez um trabalho de edição ao ponto de juntar frases”, indicou o filho de García Márquez e Mercedes. “O romance estava disperso em vários manuscritos, mas estava completo.” A cargo do editor Cristóbal Pera, que “fez um trabalho de arqueólogo”, disse Gonzalo, está, nesta edição, uma nota final que conta também com quatro páginas fac-similadas do manuscrito original de Gabo.
Se fosse vivo, García Márquez completaria 97 anos a 6 de março, dia em que é lançado mundialmente o livro. Aos filhos, o escritor terá dito: “Quando eu morrer façam o que quiserem”, contou Gonzalo García Barcha.
“Tivemos o livro fechado 5 a 7 anos”, relatou Rodrigo García Barcha na conferência de imprensa, recordando que leram “alguns pedaços” enquanto o pai escrevia. “Ele continuou a trabalhar no livro até que deixou de escrever”, explicou Rodrigo que indicou que começaram por abrir o livro inédito “aos estudiosos”. “Isso despertou em nós a vontade de voltar a lê-lo e apercebemo-nos de que o livro estava melhor do que o pai dizia”, explicou.
García Márquez era muito exigente com a sua escrita. “Nunca guardou livros não editados. Os que não gostava, destruía”, explicaram os herdeiros. Mas devido à doença - que deu os seus primeiros sinais quando deixou de se recordar com que sonhava, segundo os filhos -, o autor começou a “perder a capacidade de escrever e de ler”.
“Quando ele dizia que o livro não valia a pena, apercebemo-nos que ele já não tinha a mesma capacidade” para fazer essa avaliação, consideraram os filhos que assim, uma década depois da morte do pai, resolveram editar o livro.
Gonzalo García Barcha sente que não violaram qualquer vontade do pai até porque, explicou na conferência, ele “dizia que não funcionava", mas não o destruiu. "Isso animou-nos a publicar", disse, acrescentando que se o pai não destruiu o livro, era porque não o julgava mau. Os herdeiros referem que, agora, a obra de García Márquez fica completa. “Não há mais nada para publicar”, remataram.
Sobre o romance que esta quarta-feira chega às livrarias, consideram que “tem muitas caraterísticas” da escrita do autor de “Cem Anos de Solidão”. Tem “boa prosa, conhecimento do ser humano e poder de descrição. É uma história muito feminista”, sublinharam. Mas foi Rodrigo García Barcha quem rematou: “No final, serão os leitores que o vão julgar”.