30 dez, 2024 - 22:27 • Maria João Costa , João Pedro Quesado com Lusa
Morreu esta segunda-feira a poetisa portuguesa Adília Lopes, aos 64 anos, confirmou à Renascença fonte da editora Assírio & Alvim. A autora faleceu ao final da tarde no Hospital de São José, em Lisboa, onde estava internada.
O velório acontece na Capela do Rato, no dia 1 de janeiro, a partir das 18h. No dia seguinte, quinta-feira, a missa acontece às 13h, com o cardeal José Tolentino Mendonça. O funeral segue às 14h para o Cemitério dos Prazeres.
Maria José da Silva Viana Fidalgo de Oliveira, que usava o pseudónimo literário Adília Lopes, nasceu em 1960 em Lisboa, e chegou a estudar Física na Universidade de Lisboa - abandonando a licenciatura perto do fim, depois de lhe ter sido diagnosticada "uma psicose esquizo-afectiva, doença da qual sempre falou abertamente, fosse na sua poesia, em crónicas, conferências ou entrevistas", lê-se na biografia do Centro de Documentação de Autores Portugueses (CDAP).
A autora começou a publicar poesia em 1984, através do primeiro "Anuário de Poetas não Publicados" da Assírio & Alvim. Em 2024, Adília Lopes celebrou os 40 anos de vida literária ao publicar novamente "Dobra", uma edição que reúne a obra da poetisa e inclui poemas inéditos.
Em 1983, tinha iniciado uma nova licenciatura, de Literatura e Linguística Portuguesa e Francesa na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, que concluiu, especializando-se depois em Ciências Documentais. Trabalhou os espólios de Fernando Pessoa, Vitorino Nemésio e José Blanc de Portugal depositados na Biblioteca Nacional.
O primeiro livro, "Um Jogo Bastante Perigoso", foi publicado em 1985, em edição de autor, obra em que começa por evocar Esther Greenwood, a narradora de "Câmpanula de Vidro", reflexão sobre a depressão profunda da norte-americana Sylvia Plath.
Do período 1987-1991, apenas lhe é conhecida a edição de autor, para distribuiçao gratuita, de "Os cinco livros de versos salvaram o tio", numa espécie de paráfrase do título do livro de aventuras de Enid Blyton, "Os cinco salvaram o tio".
E são exatamente os cinco livros seguintes de Adília Lopes, publicados em pequenas mas determinantes editoras como a &etc e a Black Sun, que lhe trazem o primeiro sucesso mediático: "Maria Cristina Martins" (1992), "Peixe na água" (com desenho de Sofia Areal, 1994), "A continuação do fim do mundo" (1995), "A bela acordada" (1997) e "Clube da poetisa morta" (1997).
Em 1999, obteve uma bolsa de criação literária do antigo Instituto Português do Livro e das Bibliotecas, apoio que lhe permitiu trabalhar para teatro e "arrumar" dispersos e inéditos. A encenadora Lúcia Sigalho levaria então a cena "A birra da viva", a partir de textos da escritora, peça que viria a constitur o núcleo da trilogia "A caixa em Tóquio". A organização da obra não publicada também daria origem a "Sete rios entre campos".
Em 2000, reúniu pela primeira vez a sua produção literária num só volume, "Obra", com ilustrações de Paula Rego (1935-2022) e o inédito "O regresso de Chamilly", numa edição da Mariposa Azual, confirmando o seu logar na literatura portuguesa.
A pintora de "Angel" identificou um "impressionante paralelo" entre o seu imaginário e os poemas de Adília Lopes: "Fizeram-me logo lembrar a minha juventude, com as criadas, as bonecas, as mães ultraprotetoras", disse Paula Rego, citada na biografia do CDAP. "Adília Lopes é de um grande romantismo e ao mesmo tempo de um grotesco e de um cómico transbordantes".
O entendimento entre ambas levou Adília Lopes a traduzir a edição portuguesa de "Nursery Rhymes" ("Rimas de Berço"), álbum de gravuras de Paula Rego, baseadas em rimas infantis inglesas.
Ao logo da primeira década do novo milénio, a obra da poetisa alargou-se com edição privilegiada da &etc: "A mulher a dias", "César a César", "Poemas novos", "Le vitrail la nuit", "Caderno".
Datam destes últimos 15 anos títulos como "Apanhar ar", com desenhos da autora, "Café e caracol", "Andar a pé", "Manhã", Capilé", "Bandolim", "Estar em casa", "Dias e Dias", a que se juntaram mais três edições da poesia reunida, "Dobra", em 2014, em 2021 e a derradeira este ano, quando completou 40 anos de vida literária.
As influências assumidas por Adília Lopes passam por Sophia de Mello Breyner Andresen, Nuno Bragança, Ruy Belo, Roland Barthes, sem deixar de fora Emily Brönte, Condessa de Ségur e Enid Blyton.
Numa nota de pesar, a ministra da Cultura, Dalila Rodrigues, lamentou a morte da poetisa, "uma das mais originais e inconfundíveis vozes da poesia portuguesa".
[notícia atualizada às 00h24 de 31 de dezembro]